"A confiança é um ato de fé, e esta dispensa
raciocínio."
Carlos Drummond de Andrade
A confiança é um sentimento básico do ser humano, é o cimento que
constrói os relacionamentos, sejam amorosos, familiares, profissionais ou de
amizade. Sem a confiança, um relacionamento pode até existir, mas de forma
superficial e com cobranças e ressentimentos. Seu oposto, a desconfiança, é um
entrave real a qualquer tipo de relacionamento e nos isola. Se nos
relacionamentos a confiança no outro é imperativa, em todas as situações da
vida (mesmo nos relacionamentos), a confiança em si mesmo é condição necessária
para a ação.
Nós, seres humanos, temos a capacidade de pensar, de sentir
e de agir. Para agir, precisamos ter desenvolvido a confiança em nós mesmos, e
na ajuda do outro que podemos precisar se cairmos. A confiança desenvolve no
primeiro setênio, entre o
nascimento e os 7 anos, a fase em que somos mais dependentes
do cuidado dos outros, sejam pai, mãe, avós, babá, irmãos mais velhos. É esta
dependência, este estar aberto a ser cuidado, que permitirá o desenvolvimento
da confiança no outro que levaremos para a vida.
Cultivando
confiança
Se recebemos cuidados atenciosos, calor, proteção, a confiança no
outro florescerá com força. E esta confiança assim cultivada permitirá
discriminar quando a ação do outro é sincera ou não, quando podemos depositar
nossa confiança em alguém ou não. Se, contudo, fomos deixados de lado por quem
deveria ter cuidado de nós, ou se fomos cuidados de forma mecânica, sem o
carinho e o calor que o cuidar de uma criança pequena exige, essa confiança
fenecerá, morrerá antes mesmo de crescer, se atrofiará.
Assim também se dá com a autoconfiança. Desde o nascimento , vamos criando
as possibilidades físicas para subverter a lei da gravidade e ficarmos eretos,
de pé, e andar com nossas próprias pernas. Logo cedo firmamos o pescoço e
podemos girar a cabeça para um lado e para o outro, depois firmamos os braços e
o tronco, o que amplia essa elevação de nosso campo de visão, além de permitir
que o neném se arraste pelo chão. Essa força alcança as pernas e cintura, assim
logo estamos engatinhando, ágil e rapidamente, conquistando o mundo ao nosso
redor. Esta força nos leva a segurar nos objetos que encontramos e a nos levantarmos,
conquistando a posição vertical, para logo depois começarmos a andar. É claro
que este processo envolve muitas tentativas e erros- e o erro é cair no chão.
Caindo para depois levantar
O que acontece se os pais não permitem que a criança brinque no chão,
por medo de germes? Ou quando o neném é "presenteado" com um andador?
Ou quando a criança fica sob o olhar obsessivo dos pais para nunca cair? No
desenvolvimento de nossas biografias, esta possibilidade de cair e levantar e a
confiança de que alguém pode ajudá-lo se você cair, reaparece em outro contexto
logo que nos tornamos adultos, por volta de 21 anos. Entramos numa fase de
muitas experimentações, mergulhamos de cabeça no mercado de trabalho (muitos
até antes disso) e quebramos a cara muitas vezes, caímos e levantamos, às vezes
sozinhos, às vezes pedindo ajuda. E é através dessas experimentações que
aprendemos habilidades novas, desenvolvemos nossos potenciais criativos que nos
acompanharão pelo resto da vida.
Mas se, quando bebê, você não pôde cair e levantar, se você ficava
no berço ou no cercadinho, para não ter contato com germes ou não se machucar
se caísse, você provavelmente não terá desenvolvido a confiança em sua
capacidade de errar e depois acertar, de cair e levantar. Se você ficou num andador,
correndo pela casa sem precisar fazer esforço, de forma totalmente artificial,
como será quando você encontrar obstáculos na sua vida adulta que requerem
persistência e determinação, aquela força de vontade que você deveria ter
cultivado fazendo força enquanto segurava no sofá para levantar-se quando era
um neném? E se, a menor ameça de que você vai cair enquanto aprende a andar,
aparece uma mão adulta e forte, que impede que você conheça a dureza do chão,
como você reagirá ao ser demitido do primeiro emprego ou ao tomar um fora
daquele namorado que você pensou que fosse o homem da sua vida? O sentimento de
dureza do chão certamente será muito amplificado para quem nunca pôde
experimentá-lo.
Nossas experiências na primeira infância permitirão nosso desenvolvimento
nos primeiros momentos de nossa vida adulta. Isto não é algo imutável, contudo.
Com força de vontade podemos mudar esta determinação e transformar nossas
vidas. Assim, se você percebe que lhe falta autoconfiança, procure saber como
foi seu processo de começar a andar. Crie para si mesmo, a partir desta
compreensão, as condições para desenvolver a autoconfiança. Se cada vez que
quebra a cara você pensa em desistir, tenha a disciplina de persistir e tentar
mais uma vez (só precisa ter cuidado para ver se isso não é um padrão de
comportamento), caia e levante-se. Se precisar de ajuda, busque uma terapia ou
um grupo de ajuda mútua.
Aprenda a confiar em si e nos outros, e perceba como suas ações e
seus relacionamentos mudarão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário